segunda-feira, 30 de julho de 2007

Ateu do deus dos donos da igreja...

O Concílio criou, por momentos, uma forte respiração de Es­perança, logo seguida de uma aparente­ asfixia. Mas, entre tudo o que de ma­ra­vilhoso aconteceu no último concí­lio ecuménico, foi a inesperada consti­tui­ção conciliar Lumen Gentium que restituiu à Igreja o primado do Povo de Deus, invertendo de uma assentada a pirâmide clerical que punha o Papa aci­ma de tudo, e o Bispo em cada locali­da­de no topo de tudo, e em cada paró­quia os Padres à frente de tudo. Mas não é o que ainda agora acontece? Pa­re­ce, mas não é… mas é!
O “sistema” clerical já não funciona. Já não se aguenta. É um cadáver, um fóssil com os dias contados. O Concílio acabou com a pirâmide, inverteu-a. Virou-a com o bico para baixo.
Mas não há ainda padres a mais? É verdade que eles são cada vez menos. São uma espécie em vias de extinção e não há movimento ecológico ou de protecção de espécies que os salve da extinção. E a Igreja? Essa continuará a ter ministérios: bispos, presbíteros e diáconos e uma multidão de ministérios intermediários. Uns que já existem, outros a criar. A Igreja é um povo, o Povo de Deus, e os minis­té­rios são serviços ao serviço do Povo, desde o ministério do Bispo de Roma que na cadeira-de-Pedro preside à co­mu­nhão das Igrejas, até ao Bispo de cada Igreja Local com o seu Presbitério e os Diáconos entre nós ainda a rein­ven­tar. A Igreja, que dos Leigos recebe o nome e o conteúdo, é um povo. Uma democracia? Igreja-Democracia? Não, no sentido político, não, tal como tam­bém não é uma monarquia. É o Povo de Deus no sentido bíblico , es­ca­tológico: um Povo de Santos, Povo de Pro­fe­tas, o Povo Sacerdotal. Mas os Pa­dres é que são os sacerdotes? Não andamos para aqui cheios de paciência (calados demais) com os mandos e desmandos dos bispos e dos Padres que em nome de um funcionalismo e de funcionalidades fazem gato sapato do Povo de Deus? Não, o Cristo é o único sacerdote. O Cristo, cabeça e corpo, isto é, Ele e Nós, Nós nEle, Ele em-Nós. Impropriamente fa­lan­do, o ministério episcopal e presbite­ral mais tarde, muito depois da Carta aos Hebreus, e na sequência, por qu­an­to presidiam à Assembleia da Euca­ristia in nomine Domini, representam Cristo, cabeça da Igreja. Mas não cons­tituem um sacerdócio próprio. Próprio, conforme o ensino dos Apóstolos, é o sacerdócio de Cristo, cabeça e corpo, repito, Ele em-Nós, Nós nEle. A distinção dos dois sacerdócios, dos Padres e dos Leigos, é esta, não há outra. Povo Sa­cer­dotal.

O caminho traçado pela Lúmen Gentium é um itinerário apenas começado. Os velhos ví­cios do ritualismo e legalismo regres­saram rapidamente com grande dano pastoral. No século XIX dizia-se que os grandes avanços litúrgicos aconte­ciam por "desobediências" ousadas e corajosas. Hoje acontece o mesmo, pa­ra o melhor ou para o pior, pois tanto de­paramos nas nossas igrejas com belas e vivas celebrações como não pou­cas vezes estamos condenados a mo­nótonos, repetitivos e enjoativos actos litúrgicos incentivados pelo actual papa.
Claro que ninguém é dono da Liturgia, começando pelo Papa que tem as chaves do Reino, não só ele!
Por ser o Por­teiro, não é a Porta e também não é o dono da Casa. Toda esta dialéctica só encontra saída na liberdade dos filhos de Deus, sempre contrariada pelos dou­tores da Lei hoje tão chatos como foram nos dias de Jesus...
Senhores bispos as paróquias não são tabuleiros de xadez. Senhores padres, as paróquias não são benefícios para manter empregos mais ou menos rentáveis. E o povinho, os ministérios? Paleio de quem quer chegar a uma paróquia, ter tudo organizado, organizar à sua maneira e queixar-se do trabalho e de que os leigos não fazem nada…
Também desse Deus sou ateu. O meu deus é o de Jesus de Nazaré, o “homem”, o “Filho do homem” que se compadece das multidões.

Que fazer face às tristes regressões e estagnações que nos amarguram, ou azedam? Paci­ên­cia? Sim, mas a paciência que junta a espera com o inconformismo e a luta de quem não pode ficar desorientado nem inactivo.

2 comentários:

Carlos Godinho disse...

Pese embora não ter compreendido toda a exposição - talvez do avançado da hora! - poderei dizer que a linha de fundo é muito coerente: falta uma verdadeira comunhão numa Igreja que o é! Melhor: que sempre esteve chamada a sê-lo! A mim já me aborrece fazer parte desta "casta" de donos da Igreja! Nisso tem o meu amigo razão. Abraço.

Rui Santiago cssr disse...

COMPANHEIRO, muito obrigado pela LUCIDEZ!

Faz falta, sabes...

Mais uma vez, muito obrigado! Gosto muito de "passar por aqui"...

GRANDE ABRAÇO de COMUNHÃO.

SHALOM