terça-feira, 6 de novembro de 2007

(IN)TOLERÂNCIA RELIGIOSA E LAICISMO, NOVA RELIGIÃO DO ESTADO


A Carta sobre a Tolerância, publicada em 1689, é talvez um dos textos mais conhecidos de John Locke, filósofo inglês, do séc. XVII.
Aparece no contexto de divergências e perseguições religiosas, que tiveram a sua origem na Reforma protestante e na Contra Reforma católica. A Reforma de Lutero de 1517 teve como consequência imediata a cisão da unidade doutrinária do Ocidente, garantida, durante séculos, pela Igreja de Roma. Á data da publicação da Carta sobre a Tolerância, 1689, tinham entretanto surgido, no seio da Reforma protestante, uma miríade de Igrejas e confissões religiosas.
Em muitos aspectos, o séc. XVII foi o século da intolerância religiosa, na Europa.
O diálogo entre homens de fé, ou como diríamos hoje, o diálogo inter-religioso, é um diálogo de razões, de argumentos balizados pelos princípios da razão clássica (a evidência; a coerência; o método e a verdade), e não um confronto de fé ou credos religiosos, mais ou menos fanáticos.
O Estado deve respeitar a liberdade religiosa e as Igrejas, o predomínio do Estado e da lei, na organização social. O Estado não pode, sob pena de violar o princípio da tolerância, proibir ou condicionar a prática de ritos e cultos religiosos, seja ele qual for, a não ser no caso em que a prática religiosa ponham em risco «a vida ou propriedade alheia» (Locke).
Locke não é defensor de um Estado laico, sem religião, ou onde o laicismo é uma espécie de ‘religião pública’ do Estado, mas antes de um Estado tolerante, que acomoda em si a expressão, livre e pública, de todas as convicções religiosas dos seus cidadãos. Neste sentido, a lição que se pode retirar da Carta sobre a Tolerância é da maior importância. Porque é em nome do Estado laico, que muitos países do Ocidente têm vindo a restringir a expressão, livre e pública, dos sentimentos religiosos dos seus cidadãos. Ao querer restringir, ou condicionar, a expressão livre das convicções religiosas dos cidadãos, o Estado, como o próprio Locke já tinha previsto no séc. XVII, contribui para o aumento da intolerância religiosa. Proibir o uso no espaço público de símbolos religiosos é uma violação do princípio da tolerância e da separação entre Estado e religião. O Estado tolerante preconizado por Locke, não encara a religião como um problema, nem como uma ameaça, mas antes como uma forma de aumentar a liberdade e direitos dos seus cidadãos, no respeito pelo princípio da tolerância religiosa.


A propósito disto vai uma nota positiva ao Bispo Carlos Azevedo que diz da Concordata de 2004: "Com a nova Concordata criou-se uma nova mentalidade. A Concordata corresponde a uma nova perspectiva do papel da igreja na sociedade. Parece que não estávamos preparados para tal e não percebemos a perspectiva do II Concílio do Vaticano sobre as relações Igreja/Estado.
Por outro lado, o momento actual coincide com um laicismo mais vivo que não compreende a dimensão religiosa na vida cultural e social do povo.
O que falta é criar estruturas de negociação para que a Concordata seja regulamentada. Parece que se criou um certo vazio legal. A Concordata está em vigor mas terá que existir uma regulamentação como havia na antiga Concordata. Enquanto não há, alguns membros do Governo começam a tomar medidas soltas.
"

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